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TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO TC 016.304/2012-8 GRUPO II – CLASSE III – Plenário TC 016.304/2012-8 Apenso: TC 014.108/2012-7 Natureza: Consulta. Unidade: Secretaria de Comunicação Social – SCS/PR. Interessada: Secretaria de Comunicação Social – SCS/PR. Advogado constituído nos autos: não há. Sumário: CONSULTA. EXAME DA CONSTITUCIONALIDADE E DA LEGALIDADE DO INSTITUTO DO CREDENCIAMENTO PREVISTO NO ART. 74 DO DECRETO 6.505/2008. REGULAMENTO DE LICITAÇÕES DA EMPRESA BRASIL DE COMUNICAÇÃO. CONSIDERAÇÕES SOBRE A NATUREZA JURÍDICA DA ATIVIDADE DA EBC E SUA REPERCUSÃO NA INTERPRETAÇÃO DAS LEIS 11.162/2008 E 8.666/1993. POSSIBILIDADE DO USO DO CREDENCIAMENTO, ATENDIDAS ALGUMAS CONDICIONANTES. FRAGILIDADES NAS NORMAS OPERACIONAIS DA EBC COM RISCOS AOS PRINCÍPIOS DA MORALIDADE E DA IMPESSOALIDADE. ESCLARECIMENTOS À CONSULENTE. DETERMINAÇÃO À SEGECEX. RELATÓRIO Dada a complexidade da matéria, transcrevo a seguir a íntegra da instrução elaborada por Auditor Federal de Controle Externo da 6ª Secex e que contou com a anuência dos dirigentes daquela unidade técnica: INTRODUÇÃO 1. Cuidam os autos de consulta formulada pela Ministra de Estado Chefe da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República (Secom/PR), Srª Helena Maria de Freitas Chagas, encaminhada a este Tribunal por meio do Ofício 42/2012/GAB/SECOM- PR, de 8/6/2012 (peça 1, p. 1-2). 2. A dúvida em questão recai, em síntese, sobre a possibilidade de se utilizar a figura do credenciamento de pessoas físicas ou jurídicas para a contratação de prestação de serviços afetos à atividade-fim da Empresa Brasil de Comunicação S.A. (EBC), tendo como fundamento legal o art. 74 do regulamento 1

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TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO TC 016.304/2012-8

GRUPO II – CLASSE III – PlenárioTC 016.304/2012-8Apenso: TC 014.108/2012-7Natureza: Consulta.Unidade: Secretaria de Comunicação Social – SCS/PR.Interessada: Secretaria de Comunicação Social – SCS/PR.Advogado constituído nos autos: não há.

Sumário: CONSULTA. EXAME DA CONSTITUCIONALIDADE E DA LEGALIDADE DO INSTITUTO DO CREDENCIAMENTO PREVISTO NO ART. 74 DO DECRETO 6.505/2008. REGULAMENTO DE LICITAÇÕES DA EMPRESA BRASIL DE COMUNICAÇÃO. CONSIDERAÇÕES SOBRE A NATUREZA JURÍDICA DA ATIVIDADE DA EBC E SUA REPERCUSÃO NA INTERPRETAÇÃO DAS LEIS 11.162/2008 E 8.666/1993. POSSIBILIDADE DO USO DO CREDENCIAMENTO, ATENDIDAS ALGUMAS CONDICIONANTES. FRAGILIDADES NAS NORMAS OPERACIONAIS DA EBC COM RISCOS AOS PRINCÍPIOS DA MORALIDADE E DA IMPESSOALIDADE. ESCLARECIMENTOS À CONSULENTE. DETERMINAÇÃO À SEGECEX.

RELATÓRIO

Dada a complexidade da matéria, transcrevo a seguir a íntegra da instrução elaborada por Auditor Federal de Controle Externo da 6ª Secex e que contou com a anuência dos dirigentes daquela unidade técnica:

“INTRODUÇÃO1. Cuidam os autos de consulta formulada pela Ministra de Estado Chefe da Secretaria

de Comunicação Social da Presidência da República (Secom/PR), Srª Helena Maria de Freitas Chagas, encaminhada a este Tribunal por meio do Ofício 42/2012/GAB/SECOM-PR, de 8/6/2012 (peça 1, p. 1-2).

2. A dúvida em questão recai, em síntese, sobre a possibilidade de se utilizar a figura do credenciamento de pessoas físicas ou jurídicas para a contratação de prestação de serviços afetos à atividade-fim da Empresa Brasil de Comunicação S.A. (EBC), tendo como fundamento legal o art. 74 do regulamento simplificado para contratação de serviços e aquisição de bens, aprovado pelo Decreto 6.505, de 4/7/2008 (peça 1, p. 3-7).

HISTÓRICO3. De início, cabe esclarecer que os argumentos apresentados pela consulente foram

objeto de análise de mérito em instrução elaborada pela 6ª Secex, datada de 24/7/2012 (peça 3). No entanto, em razão de a Secom/PR ter apresentado informações adicionais, mediante Ofício 80/2012/GAB/SECOM-PR, de 4/10/2012 (peça 9), o Relator entendeu necessário o retorno dos autos à 6ª Secex, para o reexame da matéria (peça 10).

4. Em resumo, a consulente havia informado que o Decreto 6.505/2008, em atendimento ao disposto no art. 25 da Lei 11.652, de 7/4/2008, aprovou regulamento simplificado para contratação de serviços e aquisição de bens por parte da EBC. A Srª Ministra de Estado apresentou, ainda, esclarecimentos sobre peculiaridades relativas ao setor de comunicação (necessidade de agilidade operacional, competitividade do mercado) e à EBC (atuação na atividade econômico-empresarial, necessidade de disponibilizar programas de qualidade, quadro profissional

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enxuto) que, segundo ela, demandariam a utilização de procedimentos de contratação mais ágeis (peça 3, p. 1-2). Dessa forma, solicitou manifestação deste Tribunal acerca da possibilidade de a EBC adotar o instituto do credenciamento para:

a contratação de produtoras para a prestação de serviços afetos à sua atividade-fim, tais como os serviços de produção, sejam eles de coberturas e programas jornalísticos, de vídeos institucionais, de vídeos empresariais, de documentários, bem como, serviços de produção de áudio para programas de rádio, locução, spots e gravações externas, tendo como fundamentação legal o artigo 74 do seu Regulamento Simplificado para Contratação de Serviços e Aquisição de Bens, que foi aprovado pelo Decreto 6.505/2008 (peça 1).

5. Por sua vez, o art. 25 da Lei 11.652/2008 e o art. 74 do Decreto 6.505/2008 trazem os seguintes textos:

‘Art. 25. A EBC terá regulamento simplificado para contratação de serviços e aquisição de bens, editado por decreto, observados os princípios constitucionais da publicidade, impessoalidade, moralidade, economicidade e eficiência.

Art. 74. O credenciamento é ato administrativo de chamamento público destinado à contratação de serviços junto àqueles que satisfaçam os requisitos definidos pela EBC.

§ 1º O credenciamento é indicado quando:I – o mesmo objeto puder ser realizado por muitos contratados simultaneamente,

tais como serviços artísticos, audiovisuais, jornalísticos, assistência médica, odontológica, jurídica, treinamento comum;

II – houver interesse na diluição da demanda por razões de estratégia logística; ouIII – estiver caracterizada situação, reconhecida pela autoridade máxima da EBC,

que justifique a utilização desse procedimento.’

6. Na análise de mérito anterior (peça 3, p. 2-5), verificou-se que a atividade-fim da EBC é a prestação de serviços de radiofusão, comunicação e serviços conexos, sendo de sua competência a produção e difusão de programação informativa, educativa, artística, cultural, científica, de cidadania e de recreação.

7. Foi destacado que, nos termos do art. 8º, § 2º, da Lei 11.652/2008, que autorizou a constituição da EBC, foi dispensada a licitação para a contratação da mencionada empresa pelos órgãos e entidades da Administração Pública, com vistas à realização de atividades referentes ao seu objeto, desde que exista compatibilidade do valor contratado com os preços de mercado. Ao considerar esse fato, entendeu-se que, diante da hipótese de a EBC poder credenciar empresas fornecedoras de serviços de produção de TV e rádio, ela se tornaria mera intermediadora na prestação desses serviços quando eles fossem produzidos por credenciados, para fornecimento a órgão ou entidade pública, o que, ao final, poderia implicar maiores custos à Administração Pública.

8. Em complementação, observou-se que a EBC realizou investimentos da ordem de R$ 243 milhões, nos exercícios de 2009 a 2011, para a aquisição de equipamentos, veículos e móveis, bem como abriu concurso em 2011 para o preenchimento de 537 cargos. Tudo isso com vistas a cumprir sua missão institucional e realizar seus objetivos estratégicos, definidos pela lei de criação da empresa.

9. Ao final, concluiu que a contratação de serviços, por meio de credenciamento, para a execução de atividades inerentes à atividade-fim da EBC ou às respectivas categorias funcionais, caracteriza contratação indireta e terceirização indevida de atividades exclusivas dos servidores efetivos, o que contraria o art. 37, inc. II, da Constituição Federal, e não pode ser justificado nem mesmo pela existência de déficit de pessoal, conforme se verifica nos Acórdãos 2.084/2007-TCU- Plenário, 1.193/2006-TCU-Plenário, 256/2005-TCU-Plenário, 341/2004-TCU-Plenário, 593/2005-TCU-1ª Câmara e 975/2005-TCU-2ª Câmara.

10. Por outro lado, no documento posteriormente acrescido aos autos, denominado ‘memorial’ (peça 9), a Secom/PR argumenta que o núcleo essencial da atividade finalística da EBC

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estaria no ‘empacotamento’, ‘que consiste no ato de gestão de programação com vistas à escolha do conteúdo’. As demais macro-atividades – ‘produção’ e ‘distribuição’ – seriam tarefas atribuídas a qualquer radiodifusor, pouco se diferenciando na prática, ‘em se tratando de emissora pública, estatal ou privada’ (peça 9, p. 17-18). Explica que o núcleo central do papel da EBC se confirma no momento em que ela exibe na programação de seus canais conteúdos de terceiros produzidos por terceiros, citando como exemplo ‘A voz do Brasil’, que apresenta conteúdo de produções dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário.

11. Em razão disso, afirma que as atividades objeto de credenciamento, nos moldes expostos na presente consulta, deveriam ser entendidas como ações complementares, conexas às atividades finalísticas de uma empresa de comunicação pública, e que visam a agregar qualidade, expertise e valor aos serviços ofertados pela EBC, permitindo-lhe competir em condições mínimas no mercado em que atua (peça 9, p. 20-21).

12. Argumenta que a Lei 11.652/2008 estabelece, entre os princípios, competências e atribuições legais da EBC, o ‘estímulo e fomento da produção de conteúdos regionais e independentes, em mínimos legalmente estabelecidos’, para que a empresa tenha incluída em sua programação toda a diversidade prevista na mencionada lei. Os mínimos a que se refere trata-se dos 10% de conteúdo regional e dos 5% de conteúdo independente, na programação semanal, em programas veiculados no horário entre 6h e 24h, conforme previsto no art. 8º da lei em questão. Assim, no entendimento da Secom/PR e da EBC, a utilização de conteúdos de terceiros (regionais e independentes) teria fundamento em imposição legal, com definição expressa de limites mínimos e sem estipulação de percentual máximo, o que, segundo eles, poderia levar à interpretação de que com maior participação da produção independente regional nos conteúdos exibidos pelos veículos da EBC, ‘mais se levará a cabo os objetivos da lei’ (peça 9, p. 10). Essa seria, portanto, mais uma justificativa para a utilização do credenciamento.

13. Complementa que a contratação de terceiros, ‘caracterizados ora como produtores regionais, ora como produtores independentes, ora como colaboradores em pontos específicos da atividade-fim’ são necessários para que a EBC possa cumprir as previsões constitucionais e legais da radiodifusão pública e atividades conexas, a exemplo do que ocorreu nos seguintes programas/documentário: ‘Samba na Gamboa’, ‘Sem censura’ e ‘Brasília – Um sonho de três séculos’. Afinal, segundo o gestor, ‘a comunicação pública em última instância deve viabilizar os meios para veicular o pensamento plural da nossa sociedade, o que não pode ser sempre realizado por um corpo permanente de empregados públicos’ (peça 9, p. 23-25).

14. Segundo informação contida no memorial, os serviços objeto do credenciamento envolveriam: produção de programas radiofônicos; criação musical e produção de fonogramas; produção de programas de televisão; captação de imagens e transmissão de sinal via satélite, ao vivo; desenvolvimento de sistemas de gerenciamento de conteúdo para internet; hospedagem de sistemas de gerenciamento de conteúdo para internet; soluções na área de aplicativos; e serviços multimídias de agências digitais.

15. Alega ainda que a EBC está sujeita a nuances do mercado, como custos sazonais, decorrentes de escassez ou abundância de produtos e serviços, fatores que, segundo o informado, demandariam ‘mão de obra elástica’, conforme as necessidades dos serviços a serem contratados. Diante disso, informa que a EBC ‘nunca terá a força de trabalho total para atender a sazonalidade, eventualidade e velocidade dos serviços que venham a ser demandados pelo mercado privado ou pelo Estado’ (peça 9, p. 22).

16. Além disso, apresenta os ritos de credenciamento que a EBC pretenderia adotar, entre eles: instituição de comissão técnica de credenciamento, realização de inspeção técnica junto ao proponente, distribuição dos serviços de acordo com a ordem de credenciados definida em sorteio, tabelas de referência sobre valores de serviços, obrigatoriedade de observância ao manual da empresa credenciada, utilização de formulários padronizados e regras de descredenciamento (peça 9, p. 10-14). E adiciona comentários sobre o objetivo de incrementar as receitas próprias da

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EBC, como forma de garantir a respectiva sustentabilidade financeira, informando que essa competência foi atribuída à Diretoria de Captação e Serviços da empresa.

EXAME DE ADMISSIBILIDADE17. Registre-se que a consulente é legitimada para formular consulta junto a este

Tribunal, conforme o disposto no art. 264, inc. VI, do Regimento Interno do TCU (RI/TCU). Somado a isso, a consulta apresenta indicação precisa do respectivo objeto, possui pertinência temática com a área de atribuição do órgão e está acompanhada de parecer emitido pela área jurídica da EBC (Parecer 333/2012-DIJUR, peça 1, p. 8-13), de modo a atender ao contido no art. 264, §§ 1º e 2º, do RI/TCU. Destaque-se, ainda, que a consulta não versa sobre caso concreto, estando, portanto, em consonância com o art. 265 do RI/TCU.

EXAME TÉCNICO18. Em primeiro lugar, considera-se necessário avaliar as características dos serviços que

a EBC pretende contratar mediante credenciamento. Conforme exposto, esses serviços envolvem:serviços de produção, sejam eles de coberturas e programas jornalísticos, de vídeos

institucionais, de vídeos empresariais, de documentários, bem como, serviços de produção de áudio para programas de rádio, locução, spots e gravações externas; (item 4)

produção de programas radiofônicos; criação musical e produção de fonogramas; produção de programas de televisão; captação de imagens e transmissão de sinal via satélite, ao vivo; desenvolvimento de sistemas de gerenciamento de conteúdo para internet; hospedagem de sistemas de gerenciamento de conteúdo para internet; soluções na área de aplicativos; e serviços multimídias de agências digitais. (item 14)

19. Observa-se que a Secom/PR considera que tais serviços são atividades complementares ao núcleo essencial da atividade finalística da EBC (item 11).

20. Para examinar essa questão, buscou-se na internet o edital do concurso público para provimento de vagas e formação de cadastro de reserva promovido pela EBC, no exercício de 2011 (peça 12), bem como se solicitou à EBC o respectivo Plano de Empregos, Carreiras e Salários (PECS), anexando-se aos autos apenas o encadernamento do PECS (peça 11), uma vez que é nesse instrumento que se encontra registrada a descrição detalhada de cada cargo existente na mencionada empresa.

21. Somado a isso, verificou-se que, em termos básicos, os estágios envolvidos na produção de um programa para televisão, rádio ou outras mídias seriam: concepção da ideia (desenvolvimento do projeto), planejamento (pré-produção), filmagem ou gravação (produção), produto final (pós-produção / edição), finalização e distribuição (KELLISSON, Cathrine, Produção e Direção para TV e Vídeo, uma abordagem prática, tradução de Natalie Gerhardt, Rio de Janeiro/Elsevier, 2007 – 2ª reimpressão, p. 8).

22. Após isso, identificou-se, na descrição resumida das atribuições inerentes aos cargos relacionados no encadernamento do PECS, bem como no edital do concurso, os seguintes requisitos exigidos para os analistas ou técnicos de operações de empresa de comunicação pública, na atividade de:

a) locução especializada – ‘apresentar, produzir e editar programas e peças de áudio e vídeo ao vivo ou gravadas (...), além de desempenhar atividades afins e correlatas’ (peça 11, p. 17);

b) produção executiva de rádio, televisão e mídias digitais – ‘organizar, planejar e executar todos os processos de produção de peças de rádio, televisão e mídias digitais. (...) Conceituar e dirigir produtos audiovisuais, radiofônicos e para mídias digitais de acordo com o suporte de veículo de comunicação. (...) Escrever roteiros para formatos audiovisuais e de rádio – documentários, ficções, institucionais, VTs e spots publicitários, programas de televisão – empregando técnicas e linguagens específicas de acordo com o suporte e mídia. (...) Produzir, organizar e acompanhar captações para produtos documentais, ficcionais, institucionais e educativos, além de desempenhar atividades afins e correlatas’ (peça 11, p. 22);

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c) criação e desenvolvimento em web e plataformas digitais – ‘Operar software de edição, composição e efeitos para internet, vídeo, produtos gráficos e outros suportes. Conceber, elaborar e executar representações visuais da informação na forma de ilustrações, desenhos, quadros, tabelas, gráficos e etc. (...) Conhecer as ferramentas de hardware e software específicos de produção de recursos de arte em multimídia e manter-se atualizado. Diagramar imagens e textos para diferentes mídias, além de desempenhar atividades afins e correlatas’ (peça 11, p. 11);

d) engenharia de software – ‘(...) projetar aplicativos em linguagem de baixo, médio e alto nível, implementar soluções em tecnologia da informação, gerenciar ambientes operacionais. elaborar documentação (...), além de desempenhar atividades afins e correlatas’ (peça 11, p. 13);

e) produção de arte e cenografia – ‘Conceber produtos de interatividade, vinhetas, ilustrações, infografias animadas e inanimadas. (...) Criar, conceituar, projetar, produzir, coordenar e executar a construção e instalação de cenários, inclusive cenários virtuais e em locações, para diversos formatos. Compor e realizar vinhetas, desenhos, artes, ilustrações com recursos gráficos animados e inanimados. Diagramar imagens e textos para diferentes mídias. Conceber, elaborar e executar representações visuais da informação na forma de ilustrações, desenhos, quadros, tabelas, gráficos, além de desempenhar atividades afins e correlatas’ (peça 11, p. 20);

f) sonoplastia – ‘Produzir peças acústicas e musicais para produtos e veículos de comunicação sociais tais como televisão, rádio e internet (...), além de desempenhar atividades afins e correlatas’ (peça 11, p. 27); e

g) sistemas – ‘Controlar e administrar o tráfego de sinal; monitorar a transmissão e recepção de sinais de televisão; manipular áudio e vídeo; viabilizar gerações de sinais de áudio e vídeo’ (peça 11, p. 38).

23. Há ainda o cargo de jornalista de empresa de comunicação pública, que possui, entre suas atribuições: redigir e editar notícias e noticiários, redigir textos jornalísticos e releases, apresentar notícias e noticiários, organizar e planejar coberturas jornalísticas, além de desempenhar atividades afins e correlatas (peça 11, p. 29).

24. Em complementação, verificam-se no Regimento Interno da EBC (peça 13) as seguintes competências que reforçam as atribuições da EBC e do respectivo quadro de pessoal, atribuídas à:

a) diretoria de produção: ‘produzir (...) programas e demais produtos para exibição na televisão pública gerida pela EBC’;

b) diretoria de jornalismo: ‘produzir, adquirir ou contratar os conteúdos de natureza jornalística a serem veiculados pelos canais públicos de rádio, de televisão e de novas mídias da EBC (...); produzir, editar e veicular programas jornalísticos’.

25. Comparando as descrições de atividades contidas no PECS (itens 22 e 23) com as constantes na consulta e no memorial (item 18), verifica-se que os serviços que a EBC pretende contratar mediante credenciamento estão inseridos nas atribuições do pessoal efetivo da mencionada empresa, não podendo ser objeto de terceirização, sob pena de contrariar o disposto no art. 37, inc. II, da Constituição Federal. E, como se destacou na análise anterior, nem mesmo a carência de pessoal pode ser utilizada como justificativa para tal finalidade (item 9).

26. Além disso, considera-se que os serviços que se pretende repassar às empresas credenciadas são, na verdade, a essência do produto que será entregue ao cliente da EBC, pois, conforme comentado no memorial, trazem o diferencial (qualidade, expertise e valor) dos serviços que serão ofertados comercialmente pela EBC (peça 9, p. 20-22). Depois dessa fase, tem-se apenas a edição, finalização e distribuição, conforme estágios básicos apresentados no item 21 do presente documento.

27. Nesse ponto, vale lembrar que, conforme comentado na instrução à peça 3 (p. 4), a EBC pode ser contratada sem licitação pelos órgãos e entidades da Administração Pública. Assim, entende-se que poderia haver ofensa aos princípios da economicidade e da moralidade, caso esses entes viessem a contratar serviços da EBC, que seriam, por sua vez, demandados às empresas credenciadas. Afinal, se o valor de mercado de um dado programa custa um valor x para a EBC, em

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tese, deveria custar o mesmo valor para qualquer outro órgão ou entidade pública. Nesse caso, a EBC estaria intermediando o negócio, com possibilidade de tornar o produto mais caro para a Administração Pública. Mesmo que a EBC repassasse custo idêntico ao cobrado pelo terceiro, haveria obviamente frustração ao dever de licitar por parte dos entes públicos que contratarem serviços nos moldes apresentados.

28. Diante do exposto, entende-se que o instituto do credenciamento não pode ser aplicado para a contratação de serviços de produção relativos à cobertura e programas jornalísticos, de vídeos institucionais, de vídeos empresariais, de documentários, bem como, serviços de produção de áudio para programas de rádio, locução, spots e gravações externas, uma vez que esse procedimento contraria também o art. 37, caput, da Constituição Federal e o art. 3º, caput, da Lei 8.666/1993.

29. Além disso, torna-se oportuno comentar que, segundo entendimento deste Tribunal, conforme o exposto na Decisão 663/2002-TCU-Plenário e nos Acórdãos 405/2010, 560/2010 e 2811/2012, todos também do Plenário, o disposto no art. 25 da Lei 11.652/2008 e, em consequência, o completo teor do Decreto 6.505/2008, encontra-se em desacordo com o art. 173, § 1º, da Carta Magna, que dispõe o que segue.

Art. 173 (...)§ 1º A lei estabelecerá o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia

mista e de suas subsidiárias que explorem atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços, dispondo sobre: (grifo nosso)

(...)III – licitação e contratação de obras, serviços, compras e alienações, observados os

princípios da administração pública;30. Sobre o assunto, vale transcrever análise realizada no âmbito da Decisão 663/2002-

TCU-Plenário:(...) a simples permissão para a edição de um Regulamento Simplificado por meio de

decreto não é dispor sobre as matérias da forma como o constituinte derivado pretendeu. A intenção do constituinte foi de que a lei prescrevesse, determinasse, estabelecesse, estatuísse; nunca que a lei se desfizesse, se desincumbisse ou se desonerasse da responsabilidade a ela imposta (...)

(...) consoante a EC nº 19, as normas gerais de licitação e contratação, em todas as modalidades, para as empresas públicas e sociedades de economia mista e de suas subsidiárias que explorem atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços, deverão ser estabelecidas em uma lei específica, que será o estatuto jurídico dessas entidades. A edição dessa lei compete privativamente à União.

(...) as normas gerais de licitação e contratação, em todas as modalidades, para as empresas públicas e sociedades de economia mista e de suas subsidiárias que explorem atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços, continuam sendo definidas na Lei de Licitações e Contratos, publicada em 1993. Quando do advento da lei prevista no § 1º do art. 173, será afastada a incidência da Lei nº 8.666/93 sobre essas empresas. Nesse momento, essas entidades passarão a contar com estatuto próprio, estabelecido em ato normativo adequado para tanto: lei ordinária.

(...) O caput do § 1º do art. 173 ordena que a lei disporá sobre todos os incisos a ele subordinados. (...) Enquanto não é elaborado o Estatuto, é a Lei nº 8.666/93 que traz as restrições.

(...) O estatuto das empresas públicas e sociedades de economia mista e suas subsidiárias exploradoras de atividade econômica ainda será editado e disporá sobre os limites de discricionariedade admitidos ao gestor.

31. Nota-se, portanto, o entendimento do TCU no sentido de que o art. 173, § 1º, da Constituição Federal ainda não foi normatizado, nos moldes previstos pela Carta Magna. Na mesma direção, vê-se o posicionamento de doutrinadores como Marçal Justen Filho, conforme transcrito na Decisão 663/2002-TCU-Plenário:

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Em síntese, as entidades da Administração indireta permanecerão sujeitas ao regime da Lei nº 8.666 até a edição de novas regras. No futuro, haverá dois regimes básicos, um destinado à Administração direta, autárquica e indireta prestadora de serviços públicos (aí incluída a atuação de suporte à Administração) e outro para as entidades privadas exercentes de atividade econômica. O regime especial para essas últimas não consistirá na liberação pura e simples para realização de contratações, sem observância de limites ou procedimentos determinados (Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos, ed. 6, São Paulo/Dialética, 1999, p. 21).

32. Em razão disso, esta Corte considerou que padecem de vício de inconstitucionalidade o art. 67 da Lei 9.478/1997 e o Decreto 2.745/1998, que tratam do regulamento simplificado de contratação pela Petrobras.

33. No que tange à EBC, cumpre ressaltar que, conforme exposto pela Secom/PR (item 4), a EBC atua na atividade econômico-empresarial, o que se confirma nos arts. 3º, inc. VII, 8º, incs. I e II, 11, incs. II e IV, da Lei 11.652/2008, que fazem referência a características do seu campo de atuação, como, por exemplo, a exploração e a prestação de serviços de radiodifusão, com caráter competitivo.

34. Desse modo, uma vez que a Lei 11.652/2008 e o Decreto 6.505/2008 foram elaborados nos moldes das normas anteriormente mencionadas, relativas à Petrobras, entende-se oportuno dar ciência à Empresa Brasil de Comunicação S.A. que o art. 25 da Lei 11.652/2008 e o Decreto 6.505/2008 apresentam vício de inconstitucionalidade, e que, até a edição da lei de que trata o art. 173, § 1º, da Constituição Federal de 1988, as licitações e contratos da empresa devem observar os ditames da Lei 8.666/1993.

35. Com relação aos demais argumentos acrescidos ao processo, cabe comentar o que segue.

36. No que tange à sazonalidade das atividades desempenhadas pela EBC (item 15), conforme expôs a Secom/PR, trata-se de característica do mercado em que a EBC atua. Dessa forma, entende-se que, em tese, todas as empresas do ramo estão sujeitas a ela. Assim, é louvável que a EBC busque alternativas para resolver essa questão, mas as soluções devem estar condizentes com a sua condição de empresa pública exploradora de atividade econômica, submetida, portanto, às normas de direito público.

37. Ademais, cabe destacar que o art. 27 da Lei 11.652/2008 prevê a possibilidade de a EBC contratar, por inexigibilidade de licitação, especialistas para a execução de trabalhos nas áreas artística, audiovisual e jornalística, por projetos ou prazos limitados, procedimento que, em tese, permite à mencionada empresa atender eventual aumento de demanda.

38. Quanto à previsão em lei sobre o fomento à produção de conteúdos regionais e independentes (itens 12 e 13), cabe trazer aos autos os exatos termos apresentados na Lei 11.652/2008:

Art. 2º A prestação dos serviços de radiodifusão pública por órgãos do Poder Executivo ou mediante outorga a entidades de sua administração indireta deverá observar os seguintes princípios:

(...)IV – promoção da cultura nacional, estímulo à produção regional e à produção

independente;Art. 8º Compete à EBC:(...)IX – garantir os mínimos de 10% (dez por cento) de conteúdo regional e de 5% (cinco por

cento) de conteúdo independente em sua programação semanal (...).(...)§ 4º Para os fins no disposto no inciso IX deste artigo, entende-se:I – conteúdo regional: conteúdo produzido num determinado Estado, com equipe técnica e

artística composta majoritariamente por residentes locais;II – conteúdo independente: conteúdo cuja empresa produtora, detentora majoritária dos

direitos patrimoniais sobre a obra, não tenha qualquer associação ou vínculo, direto ou indireto, 7

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com empresas de serviço de radiodifusão de sons e imagens ou prestadoras de serviço de veiculação de conteúdo eletrônico.

(...)§ 5º Para o cumprimento do percentual relativo a conteúdo regional, de que trata o inciso

IX do caput deste artigo, deverão ser veiculados, na mesma proporção, programas produzidos em todas as regiões do País.

39. Note-se que a lei dispõe que a EBC tem por princípio, entre outros, estimular a produção regional e a produção independente. No Dicionário Aurélio, vê-se que a palavra ‘estimular’ refere-se a termos como ‘excitar’, ‘instigar’, ‘encorajar’, ações que podem ser realizadas de outras formas pela EBC, por exemplo, por meio de concurso ou contratação direta, adequada a cada caso específico.

40. Ademais, a consulta não versa sobre a ‘contratação’ de conteúdos de terceiros, mas sobre a contratação de produtoras para a prestação regular de serviços. A veiculação de conteúdos de terceiros, por meio de contrato, convênio ou outro tipo de ajuste, é estimulada pela Lei 11.652/2008, conforme consta em seus arts. 2º, incs. II e IV, 3º, incs. V, VIII, IX, e 8º, incs. III, IV e IX. Há ainda a exceção prevista no art. 27 da mencionada lei (item 36). Assim, ratifica-se que o credenciamento também não seria, em princípio, a solução mais efetiva para as contratações em questão.

CONCLUSÃO41. A consulta, constante à peça 1, deve ser conhecida, por preencher os requisitos

previstos nos arts. 264 e 265 do Regimento Interno do TCU.42. Diante das análises efetuadas na presente instrução, entende-se que a adoção do

credenciamento de pessoas físicas ou jurídicas, pela EBC, para efeito de contratação de serviços de produção, sejam eles de coberturas e programas jornalísticos, de vídeos institucionais e empresariais, de documentários, bem como serviços de produção de áudio para programas de rádio, locução, spots e gravações externas, contraria o art. 37, caput e inc. II, da Constituição Federal e o art. 3º da Lei 8.666/1993, uma vez que caracteriza contratação indireta e terceirização de atribuições afetas à atividade-fim da EBC e às respectivas categorias funcionais (itens 25 e 28).

43. Considerada a situação prevista no art. 27 da Lei 11.652/2008 e na Decisão 663/2002-TCU-Plenário, entende-se necessário, ainda, dar ciência à Empresa Brasil de Comunicação que o art. 25 da Lei 11.652/2008 e o Decreto 6.505/2008 padecem de vício de inconstitucionalidade, e que, até a edição da lei de que trata o art. 173, § 1º, da Constituição Federal de 1988, as licitações e contratos da empresa devem observar os ditames da Lei 8.666/1993 (item 34).

BENEFÍCIOS DE CONTROLE44. Em conformidade com a Portaria-Segecex 10/2012 e seu anexo, registram-se como

benefícios potenciais da ação de controle, advindos da proposta de encaminhamento dos presentes autos, o incremento da expectativa de controle e a melhoria da gestão administrativa da Unidade.

PROPOSTA DE ENCAMINHAMENTO45. Ante o exposto, submetem-se os autos à consideração superior, propondo:I. conhecer da presente consulta, ante o preenchimento dos requisitos de

admissibilidade previstos nos arts. 264 e 265 do Regimento Interno do TCU (item 17);II. responder à consulente que não é possível a adoção do credenciamento de pessoas

físicas ou jurídicas pela EBC, conforme o previsto no art. 74 do respectivo regulamento simplificado para contratação de serviços e aquisição de bens, bem como a utilização de quaisquer das modalidades licitatórias constantes do art. 11 desse mesmo regulamento, para a contratação de serviços afetos à atividade-fim da empresa ou às suas categorias funcionais, tais como serviços de produção, sejam eles de coberturas e programas jornalísticos, de vídeos institucionais e empresariais, de documentários, bem como serviços de produção de áudio para programas de rádio, locução, spots e gravações externas, uma vez que caracteriza contratação indireta e terceirização

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indevida de atividade-fim, contrariando a exigibilidade constitucional de concurso público e os princípios da economicidade, da legalidade e da moralidade, conforme o previsto no art. 37, caput e inc. II, da Constituição Federal, e no art. 3º, caput, da Lei 8.666/1993 (itens 25 e 28);

III. dar ciência à Empresa Brasil de Comunicação S.A. (EBC) que o art. 25 da Lei 11.652/2008 e o Decreto 6.505/2008 padecem de vício de inconstitucionalidade, e que, até a edição da lei de que trata o art. 173, § 1º, da Constituição Federal, na redação dada pela Emenda Constitucional 19/98, as licitações e contratos da empresa devem observar os ditames da Lei 8.666/1993;

IV. encaminhar à Ministra de Estado Chefe da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República (Secom/PR), Srª Helena Maria de Freitas Chagas, e à Empresa Brasil de Comunicação S.A. (EBC) cópia da decisão que vier a ser adotada pelo Relator, acompanhada do respectivo Relatório e Voto;

V. arquivar os presentes autos, nos termos do art. 169, inc. V, do RI/TCU.

É o Relatório.VOTO

Trago à apreciação deste Plenário consulta formulada pela Ministra de Estado Chefe da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República (Secom/PR), Exmª Srª Helena Maria de Freitas Chagas, encaminhada a este Tribunal por meio do Ofício 42/2012/GAB/SECOMPR, de 8/6/212.2. Preliminarmente, averbo que a consulta atende a todos os requisitos formais postos no art. 264 do Regimento Interno deste nosso Tribunal de Contas da União, quais sejam: a) formulada por Ministra de Estado (inciso IV); b) instruída com parecer jurídico (§ 1º); c) indica de forma precisa seu objeto (§ 1º); d) o qual tem pertinência temática com a respectiva área de atribuição da consulente (§ 2º); d) tendo caráter abstrato, conforme transcrevo, verbis:

‘Considerando as reiteradas decisões do TCU no sentido de que o credenciamento deve ser utilizado para a contratação de serviços médicos, jurídicos e de treinamento, desde que a Administração fixe critérios objetivos, e ainda que sejam observados quatro aspectos fundamentais quando da análise da adequação do uso do credenciamento , quais sejam: contratação de todos os selecionados, mesmo que demandados em quantidade não uniforme; impessoalidade/objetividade na definição da demanda por contratado; que reste demonstrado, no processo, a vantagem/igualdade dos valores definidos em relação aos preços de mercado; e, por fim, que o objeto, e não as características pessoais do selecionado, satisfaçam as exigências do Edital, seria, no entendimento dessa Corte, juridicamente viável a utilização pela EBC da figura do credenciamento para a contratação de produtoras para prestação de serviços afetos a sua atividade fim, tais como os serviços de produção, sejam eles de coberturas e programas jornalísticos, de vídeos institucionais, de vídeos empresariais, de documentários, bem como, serviços de produção de áudio para programas de radio, locução, spots e gravações externas, , tendo como fundamentação legal o artigo 74 do seu Regulamento Simplificado para Contratação de Serviços e Aquisição de Bens, que foi aprovado pelo Decreto no 6.505/2008?’ (grifos meus)

3. Superada a preliminar, cabe-me passar ao mérito e para estruturar meu voto o dividi em três momentos essenciais. Primeiramente, demonstrarei a existência de duas matrizes constitucionais distintas no campo da licitação e contratação públicas, com repercussão em toda a interpretação das normas a elas referentes. Em um segundo momento, aplicarei essas premissas interpretativas à questão da possibilidade, ou não, da convivência das atividades fins da Empresa Brasil de Comunicação S.A. prestadas diretamente por pessoal do quadro de empregados e prestadas por empresas contratadas. Por fim, caso seja possível essa convivência, analisarei o regime de credenciamento previsto no art. 74 do Decreto 6.505/2008, que regulamenta a Lei nº 11.652/2008, não apenas pela sua possibilidade jurídica, mas também em relação ao detalhamento operacional do referido instituto, tal como empreendido pela

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EBC. Para realizar esta última tarefa, atuarei nos moldes da investigação de acidentes aéreos, ou seja, utilizarei o que apreendemos com os fatos narrados na Ação Penal nº 470, recentemente julgada pelo Supremo Tribunal Federal.4. Passo ao primeiro elemento de meu voto: a existência de duas matrizes constitucionais distintas no campo da licitação e contratação públicas, com repercussão em toda a interpretação das normas a elas referentes. A abordagem desta matéria convergirá para as empresas de comunição, pois esse é o objeto desta Consulta e nos permitirá observar as diferenças mais agudas em relação às contratações públicas firmadas pela administração direta, autárquica e fundacional. Tal afirmação deriva das seguintes normas constitucionais:

‘Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:XXVII – normas gerais de licitação e contratação, em todas as modalidades, para as

administrações públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, obedecido o disposto no art. 37, XXI, e para as empresas públicas e sociedades de economia mista, nos termos do art. 173, § 1º, III;

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

XXI – ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações.

Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei.

§ 1º A lei estabelecerá o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias que explorem atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços, dispondo sobre:

I – sua função social e formas de fiscalização pelo Estado e pela sociedade;II – a sujeição ao regime jurídico próprio das empresas privadas, inclusive quanto aos

direitos e obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributários;III – licitação e contratação de obras, serviços, compras e alienações, observados os

princípios da administração pública;IV – a constituição e o funcionamento dos conselhos de administração e fiscal, com a

participação de acionistas minoritários;V – os mandatos, a avaliação de desempenho e a responsabilidade dos administradores.§ 2º – As empresas públicas e as sociedades de economia mista não poderão gozar de

privilégios fiscais não extensivos às do setor privado.§ 3º – A lei regulamentará as relações da empresa pública com o Estado e a sociedade.Art. 175. Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de

concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos.Parágrafo único. A lei disporá sobre:I – o regime das empresas concessionárias e permissionárias de serviços públicos, o caráter

especial de seu contrato e de sua prorrogação, bem como as condições de caducidade, fiscalização e rescisão da concessão ou permissão;

II – os direitos dos usuários;III – política tarifária;IV – a obrigação de manter serviço adequado.

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Art. 220. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.

§ 1º – Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observado o disposto no art. 5º, IV, V, X, XIII e XIV.

§ 2º – É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística.Art. 221. A produção e a programação das emissoras de rádio e televisão atenderão aos

seguintes princípios:I – preferência a finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas;II – promoção da cultura nacional e regional e estímulo à produção independente que

objetive sua divulgação;III – regionalização da produção cultural, artística e jornalística, conforme percentuais

estabelecidos em lei;IV – respeito aos valores éticos e sociais da pessoa e da família.Art. 223. Compete ao Poder Executivo outorgar e renovar concessão, permissão e

autorização para o serviço de radiodifusão sonora e de sons e imagens, observado o princípio da complementaridade dos sistemas privado, público e estatal.’

5. A moldura constitucional me autoriza formular algumas conclusões. A primeira delas é a de que, ainda que falte a lei geral de licitações e contratos das empresas públicas e sociedades de economia mista, não posso aplicar a elas a mesma lógica na interpretação da Lei 8.666/1993 utilizada para as fundações públicas e autarquias. Explico: como se sabe, interpretar é ato de concretizar a norma e, como diz Friedrich Müller, “os textos de prescrições que encontramos nos jornais oficiais ou as compilações legislativas, os textos de normas, portanto, não são normativos. Eles são incapazes de levar a uma solução obrigatória do caso concreto. São os dados iniciais não (ainda) normativos do processo concretizador” (Discours de la Méthode Juridique, p. 196-197), pois, segundo Müller, a normatividade seria então a propriedade dinâmica de uma norma, sendo tal propriedade dividida em duas concepções: a de ordenar a realidade que lhe é subjacente e a de ser condicionada por tal realidade.6. Dito isso, nos termos do inciso XXVII do art. 22, devo ler as normas a partir dos princípios da administração pública dispostos na cabeça do art. 37, e não das regras postas no inciso XXI do art. 37, todos da Constituição. Outra conclusão essencial é a de que o ramo de comunicação explorado pela EBC caracteriza-se como atividade econômica, tal como decorre da leitura do artigo 175 da Constituição, dada a total incompatibilidade do referido dispositivo para a atividade da EBC. Não vejo como aplicar aos veículos de comunicação as amarras postas nas regras de controle das atividades das empresas concessionárias de serviços públicos. Posso concluir que se trata de atividade econômica descrita no art. 173 combinadamente com o art. 223, ambos da Constituição, que o Estado explora por relevante interesse coletivo e em caráter de complementaridade. Dessa constatação e das regras constitucionais específicas estou autorizado a afirmar se tratar de atividade econômica sui generis, porquanto está pautada pela liberdade de criação e de informação, exigindo, dada sua natureza, elasticidade, agilidade e competências criativas incomuns, porquanto se trata de um mercado altamente criativo e competitivo, no qual a escolha do consumidor depende de apenas um toque no controle remoto. Daí a necessidade de um Direito Privado Administrativo, na classificação doutrinária de Ossenbühl (Oeffentliches Recht um Privatrecht in der Leistungsverwaltung, 1974, p. 543), onde o direito privado é mitigado pelos princípios do direito administrativo (a abertura do direito público ao direito privado na gestão de desempenho). Dessa concepção emerge uma afirmação: a inexistência da lei de que fala o § 1º do art. 173 da Constituição autoriza a aplicação da Lei 8.666/1993, mas interpretá-la a partir de institutos puros de direito administrativo gera resultados inconstitucionais. Para evitá-los temos que trabalhar com o efeito transacional sinalagmático (a expressão não é minha), ou seja, a inexistência da lei requerida pelo art. 173 da Constituição legitima a aplicação da Lei nº 8.666/1993, mas a interpretação da Lei 8.666/1993 para as

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sociedades de economia mista e empresas públicas está condicionada pelas disposições do art. 173 da Constituição.7. Passo a sindicar a Lei nº 11.652/2008, que autorizou a criação da EBC, e argumentarei em contraste com a Lei 9.478/1997, que tantas vezes foi alvo de análise neste nosso Tribunal. Diz a lei do petróleo:Art. 67. Os contratos celebrados pela PETROBRAS, para aquisição de bens e serviços, serão precedidos de procedimento licitatório simplificado, a ser definido em decreto do Presidente da República.8. Vejamos agora o dispositivo semelhante da Lei nº 11.162/2008:Art. 25. A EBC terá regulamento simplificado para contratação de serviços e aquisição de bens, editado por decreto, observados os princípios constitucionais da publicidade, impessoalidade, moralidade, economicidade e eficiência.9. Bem de ver que a Lei nº 11.162/2008 cumpre o requisito da observância dos princípios da administração pública previsto no inciso III do § 1º do art. 173, silenciando sobre a simplificação de todos os procedimentos licitatórios. Acresço que a própria Lei da EBC coloca-a sob a submissão da Lei nº 8.666/1993. Esse é o caso do art. 27, verbis:Art. 27. A EBC poderá contratar, em caráter excepcional e segundo critérios fixados pelo Conselho de Administração, especialistas para a execução de trabalhos nas áreas artística, audiovisual e jornalística, por projetos ou prazos limitados, sendo inexigível a licitação quando configurada a hipótese referida no caput do art. 25 da Lei no 8.666, de 21 de junho de 1993.10. Não tenho dúvida de que está afastada a questão da constitucionalidade do Decreto 6.505/2008, porquanto ele se sustenta na Lei nº 11.162/2008, a qual submete a EBC a dispositivo da Lei 8.666/1993, pelo que posso bem entender que se aplica ao decreto, por analogia, o art. 119 da lei geral de licitações e contratos, ou seja, o decreto está autorizado por ambas as leis. Daí não poder acompanhar a unidade técnica no sentido de afastar o citado regulamento por inconstitucionalidade ou ilegalidade de forma abstrata. De outra, boa parte da doutrina, a meu ver acertadamente, define o credenciamento como hipótese de inexigibilidade de licitação precedida de chamamento público como garantia do princípio da impessoalidade. Resta-me perquirir se o procedimento de credenciamento estabelecido pelo decreto é compatível com o art. 26 da Lei 8.666/1993 (define os elementos integrantes do processo de inexigibilidade de licitação).11. Nessa perspectiva, passo a tratar da validade do art. 74 do referido Decreto nº 6.505/2008, ou seja, no instituto do credenciamento nele previsto, verbis:

‘Art. 74. O credenciamento é ato administrativo de chamamento público destinado à contratação de serviços junto àqueles que satisfaçam os requisitos definidos pela EBC.

§ 1º O credenciamento é indicado quando:I – o mesmo objeto puder ser realizado por muitos contratados simultaneamente, tais

como serviços artísticos, audiovisuais, jornalísticos, assistência médica, odontológica, jurídica, treinamento comum;

II – houver interesse na diluição da demanda por razões de estratégia logística; ouIII – estiver caracterizada situação, reconhecida pela autoridade máxima da EBC, que

justifique a utilização desse procedimento.§ 2º O pagamento dos credenciados é realizado de acordo com a demanda, tendo por base

o valor pré-definido pela EBC, a qual poderá utilizar-se de tabelas de referência.§ 3º No credenciamento, o edital deverá prever:I – o período de inscrição, o qual poderá ter termo definido ou ser permanentemente

aberto;II – o projeto dos serviços desejados e os critérios técnicos que utilizará para julgamento;III – o prazo mínimo de oito dias úteis, entre a publicação do edital e a apresentação da

documentação;IV – a aplicação das regras pertinentes à impugnação do edital; eV – a validade de até um ano, admitida uma única prorrogação por igual período.’

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12. Acerca do tema, estamos diante de um falso paradoxo, pois o credenciamento não é licitação (como dito acima, doutrinadores o conceituam como hipótese de inexigibilidade), mas é precedido de edital, no qual todos que cumpram seus requisitos serão considerados vencedores. Segundo Adilson Abreu Dallari o credenciamento é “o ato ou contrato formal pelo qual a Administração Pública confere a um particular, pessoa física ou jurídica, a prerrogativa de exercer certas atividades materiais ou técnicas, em caráter instrumental ou de colaboração com o Poder Público, a título oneroso”. Portanto, o credenciamento afigura-se como hipótese prevista na lei, uma espécie de inexigibilidade de licitação no momento de contratação, precedida de etapa prévia, na qual todos tiveram igual oportunidade de se credenciar, ampliando notavelmente as exigências do art. 26 da Lei nº 8.666/1993 (que se resume à justificação do preço e da escolha do contratado). No Acórdão nº 1.913/2006 – 2ª Câmara – Relator Ministro Walton Alencar Rodrigues, apesar de o tema ter sido a contratação de serviços advocatícios, este Tribunal de Contas estabeleceu importantes parâmetros, como segue: “deve-se proceder o devido certame licitatório, conforme dispõe o inciso XXI do art. 37 da Constituição Federal e o art. 2º da Lei 8666/93, e no caso da competição se tornar inviável, realize a pré-qualificação dos profissionais aptos a prestarem o serviço, adotando sistemática objetiva e imparcial da distribuição de causas entre os pré-qualificados, de forma a resguardar o respeito aos princípios da publicidade e da igualdade”.13. Cabe-me formular outra pergunta: o que tornaria a competição inviável para o caso de contratação de serviços artísticos, audiovisuais, jornalísticos, ou, como consta da consulta, contratação de produtoras para prestação de serviços afetos a sua atividade fim, tais como os serviços de produção, sejam eles de coberturas e programas jornalísticos, de vídeos institucionais, de vídeos empresariais, de documentários, bem como, serviços de produção de áudio para programas de radio, locução, spots e gravações externas? A resposta decorre da atividade a EBC, conforme declinado por ela própria e confirmado pela Lei 11.162/2008. Vejamos alguns dispositivos legais exemplificadores, seguidos de meus comentários. O art. 3º estabelece dentre os objetivos da radiodifusão: a) “I – oferecer mecanismos para debate público acerca de temas de relevância nacional e internacional;”: entendo que os temas de relevância nacional e internacional podem surgir por catástrofes e eventos imprevistos. Imaginemos a renúncia do papa, a morte inesperada de um líder mundial, o ‘11 de Setembro’. Caso a EBC necessite mobilizar meios especiais, aparelhagem de última geração, especialistas no tema e, para isso, tenha que licitar, o tema continuaria relevante, mas perderia o timing da informação. A EBC promoveria um debate público quando todos pararam de debater sobre o tema; b) “V – apoiar processos de inclusão social e socialização da produção de conhecimento garantindo espaços para exibição de produções regionais e independentes;”: uma das formas de garantir das produções regionais é, quando dos temas regionais relevantes, utilizar de produtores regionais credenciados; c) “VII – direcionar sua produção e programação pelas finalidades educativas, artísticas, culturais, informativas, científicas e promotoras da cidadania, sem com isso retirar seu caráter competitivo na busca do interesse do maior número de ouvintes ou telespectadores;”: o permanente desafio de manter o caráter competitivo na busca do interesse dos telespectadores e ouvintes requer arejamento, ideias novas etc. Estamos efetivamente diante de um mercado ágil, flexível e criativo. Em uma frase: a EBC é uma empresa pública que explora atividade econômica sob o severo regime de liberdade de imprensa. Um mercado onde não apenas basta informar, mas é necessário criar o interesse pela informação e instigar a cultura da reflexão e do debate público. Daí que não posso interpretar as normas da EBC como fazemos com outras atividades exploradas diretamente pelo Estado. Creio ser oportuno rememorar que na essência do julgamento acerca do Regime Diferenciado de Contratação – RDC – estão duas premissas: a) o processo licitatório estabelecido na Lei nº 8.666/1993 não é um valor em si, ou seja, caso se consiga estabelecer outros mecanismos que garantam o resultado com maior eficiência e consoante os princípios basilares da administração pública, a solução será constitucional; b) as situações fáticas diferenciadas legitimam a convivência de vários regimes de licitação também diferenciados.14. Firmadas a constitucionalidade, a legalidade e a legitimidade do procedimento de credenciamento, passo à segunda questão: a possibilidade, ou não, da convivência das atividades fins da

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Empresa Brasil de Comunicação S.A. prestadas diretamente por pessoal do quadro de empregados e por empresas contratadas.15. Falei acima sobre a sazonalidade típica da atividade de comunicação. Os fatos cotidianos, em suas velocidade e multiplicidade conduzem o mercado de comunicação, e não a lógica da economia. Nesse sentido, teríamos três possibilidades de resolver o problema: a) para enfrentar a flexibilidade do mercado a EBC decide implantar um quadro de empregados excessivamente grande, de forma a garantir a existência de mão de obra, complementada por razoável quantidade de equipamentos reserva, trabalhando em regime de ociosidade em boa parte do tempo; b) trabalha com efetivo para a demanda prevista normal, não atendendo as exigências decorrentes dos fatos imprevisíveis; c) adota uma postura híbrida, garantindo quadro de empregados para as atividades planejáveis e cotidianas, aliado a uma reserva de pessoas contratáveis no mercado, suprindo agilmente as demandas de última hora. A solução que melhor prestigia os princípios da eficácia e da eficiência é a última, cuja obviedade me dispensa de maiores comentários.16. Em sendo assim, não posso concordar com a tese de que o credenciamento ofende o inciso II do art. 37 da Constituição, ou seja, configuraria burla ao concurso público. A burla ao concurso público requer o desejo de burlar, bem assim que empregos não sejam apenas permanentes, mas que seu preenchimento seja precedido do requisito da necessidade. Potencializar exacerbadamente a regra pela regra, admitindo as hipóteses do gigantismo do quadro em regime de ociosidade ou a ineficiência da empresa pelas aporias decorrentes da interpretação “exagerada” do dispositivo constitucional, não realiza a Constituição como um todo. Essa interpretação “exagerada” não está sincronizada com a exploração da atividade econômica pelo Estado, cujos “instrumentos de atuação extravasam os esquemas tradicionais” (Vasco Pereira da Silva. Em busca do acto administrativo perdido. Coimbra: Almedina, 2003, p. 129), o que nos exigirá redirecionar o foco do controle para os resultados (as finalidades da EBC), com as salvaguardas dos princípios da administração pública. E não há nada nos autos que me autorize a concluir, sem a ocorrência concreta da hipótese, que a não execução direta dos serviços pela EBC feriria os princípios da economicidade e da moralidade. Isso porque não posso, na condição de magistrado, partir da premissa incomprovada de que a EBC não agregará nada ao produto contratado ao credenciado, figurando como mera intermediária.17. Portanto, o instituto do credenciamento convive perfeitamente com a existência no quadro da EBC de empregados com atribuições semelhantes. A convivência se dará pela utilização do instituto do credenciamento para projetos ou prazos limitados segundo requisitos a serem fixados pelo Conselho de Administração da EBC (art. 27 da Lei 11.652/2008), a exemplo da regionalização, dos efeitos da plasticidade do mercado em função da dinamicidade dos fatos e da insuficiência quantitativa e qualitativa (especialização) dos recursos humanos e materiais da EBC para o cumprimento de determinadas tarefas.18. Passo ao último quesito da estrutura de meu voto, qual seja: analisar o regime de credenciamento previsto no art. 74 do Decreto 6.505/2008 em relação ao detalhamento operacional do referido instituto, tal como empreendido pela EBC. Para isso, atuarei nos moldes da investigação de acidentes aéreos, ou seja, utilizarei o que apreendemos com os fatos narrados na Ação Penal nº 470, julgada pelo Supremo Tribunal Federal, de maneira a impedir que acontecimentos se repitam pela fragilidade normativa ou pela anomia. É que o direito administrativo tem hoje a missão de harmonizar o controle da Administração com sua eficiência. Construir tal sistema de equilíbrio mostra-se como o maior desafio dessa disciplina jurídica (Patrícia Baptista. Transformações do Direito Administrativo. Renovar, 2003, p. 23).19. Vejamos os ritos específicos de credenciamento instituídos pela EBC, demonstrado por ela própria no item 36 dos Memoriais:

– Instituição de Comissão Técnica de Credenciamento – Comissão da EBC especialmente formada para julgamento da solicitação de credenciamento em sessões internas;

– Realização de Inspeção Técnica – Consiste em inspeção as instalações da proponente, com avaliação feita durante a inspeção será registrada no “Termo de Inspeção” pela Comissão Técnica de Credenciamento da EBC;

– Distribuição de Serviços por Critérios – Os critérios para a distribuição dos serviços padronizados são e de acordo com a conveniência da EBC, mediante a realização de seguimento

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alternado entre as empresas credenciadas, obedecida a ordem estabelecida em sorteio, de acordo com os critérios previstos em edital de credenciamento;

– Convocação por “Solicitação de Atendimento de Demanda” – Trata da convocação das empresas integrantes da lista de credenciadas, efetuada por meio de regras padrão definidas na “Solicitação de Atendimento de Demanda”;

– Atendimentos em Caráter de Urgência – Há previsão expressa contratual de atendimento para situações sazonais e excepcionais nas demandas com caráter de urgência, pela qual a empresa proponente credenciada deverá responder a EBC sobre a confirmação de aceitação dos serviços no prazo máximo de ate 06 (seis) horas a contar do recebimento da comunicação, observado o horário comercial;

– Utilização de Demanda Vinculada – Na previsão de demanda vinculada, derivada ou complementar, a uma demanda em andamento, a distribuição dos serviços será dirigida, preferencialmente, para a Credenciada que esteja atuando no serviço;

– Tabelas de Referenda sobre Valor de Serviços – a EBC utiliza sua “Tabela de Valores Referência”, “Fórmula para Desconto com Quantidade” e “Tabela de Limites Máximos para Despesas Variáveis” nos contratos com credenciados; e

– Obrigatoriedade de observância ao “Manual da Empresa Credenciada” – Há menção expressa dirigida ao credenciado sobre o cumprimento de “Manual da Empresa Credenciada”, documento com as regras de atendimento das formulações da EBC a e respeito de rotinas, etapas de produção e os prazos para execução e conclusão dos serviços no qual estão estabelecidos, composto por:

a) Definição de Rotinas – trata do âmbito de aplicação que define as rotinas, etapas de produção, a forma de relacionamento entre a EBC e a empresa credenciada, e a qualidade técnica da prestação de serviços da contratada;

b) Definição da Expertise – trata da expertise técnica atrelados a Certificação da Capacidade Técnica com requisitos mínimos de expertise do prestador do serviço, detalhado por categorias profissionais e atestos pregressos sobre atuação profissional;

c) Definição Produção – trata de rotinas, etapas de produção e entrega com: i) Envio de “Solicitação de Atendimento de Demanda” , Envio de Resposta a “Solicitação de Atendimento de Demanda”, ii) Briefing para definição dos parâmetros do produto (conteúdo, especificações técnicas e prazos) a ser entregue pela contratada dentro do prazo acordado), iii) “Proposta de Atendimento de Demanda”, informando obrigatoriamente o descritivo do Briefing recebido, Equipe necessária para o pleno atendimento da demanda, Eventual necessidade de viagens e deslocamentos (Despesas Variáveis); Orçamento, detalhado em planilha observando os preços contidos na “Tabela de Valores Referência”, na “Formula de Desconto com Quantidade” e na “Tabela de Limites Máximos para Despesas Variáveis”, estabelecidas pela EBC; e “Cronograma de Execução”, além de quaisquer outras informações relevantes para a prestação de serviços; iv) Aceite da proposta por parte da EBC; v) Apresentação de piloto do produto encomendado, observando os parâmetros de conteúdo e especificações técnicas definidos no Briefing e o prazo acordado entre as partes; e vi) Entrega do produto final para o atesto formal da EBC;

d) Apuração certificada no “Termo de Avaliação da Empresa Credenciada” – Documento de avaliação e registro emitido após a conclusão dos serviços demandados com objetivo aperfeiçoar os subsequentes processos de Credenciamento e melhorar a prestação de serviços realizados pelas contratadas e/ou deflagrar eventuais descredenciamentos em razão de prestação de serviços não satisfatória.20. Ao analisar o Decreto nº 6.505/2008 havia percebido um ponto de fragilidade e pontos positivos na sistemática de credenciamento, os últimos com vantagens sobre o regime de inexigibilidade de licitação previsto nos artigos 25 e 26 da Lei nº 8.666/1993.21. A fragilidade estaria exatamente no fato de que no credenciamento de médicos e odontólogos a isonomia e a impessoalidade estão garantidas pelo fato de a escolha dos referidos profissionais, no momento da prestação dos serviços, recair sobre o usuário direto, ou seja, o paciente é quem escolhe e não a administração pública. De pronto, senti a necessidade de critérios objetivos no momento da escolha do prestador credenciado, exatamente para não reincidir a EBC nos eventos julgados

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na AP 470 (direcionamento a determinadas empresas de publicidade de serviços mais rentáveis e de controles mais difíceis em função de suas características). Verifico que a EBC instituiu critérios objetivos, quais sejam: a) Distribuição de Serviços por Critérios; b) Convocação por “Solicitação de Atendimento de Demanda”; c) Atendimentos em Caráter de Urgência; d) Utilização de Demanda Vinculada.22. Passarei a analisar alguns desses critérios objetivos. O primeiro deles, a “Distribuição de Serviços por Critérios” deve seguir o interesse público e não a simples conveniência da EBC. Adicionalmente, embora o critério de sorteio seja louvável, a objetividade pode ser destruída caso a ordem dos serviços seja indevidamente manipulada por empregados da EBC. Mais especificamente: sabedores de quem será a próxima contratada ordenar-se-ia a fila dos serviços de modo a que aquele mais atraente coincida com a empresa a ser beneficiada. A princípio não vejo como a “Solicitação de Atendimento de Demanda” contorne esse risco. Note-se bem, não estou a pré-julgar a EBC ou a considerar essa hipótese como viável. Estou a fazer uma análise de riscos, uma vez que não se deve esperar a repetição do ‘acidente’ para instituir mecanismos de prevenção.23. Seguindo na análise, preocupam-me as regras postas para “Atendimentos em Caráter de Urgência” em função de situações sazonais e excepcionais. Como disse durante todo este meu Voto, uma das principais causas justificadoras da adoção do regime de credenciamento pela EBC é a flexibilidade decorrente da sazonalidade e da excepcionalidade das situações. Portanto, a urgência é praticamente a tônica do credenciamento. Nessa perspectiva, creio que o prazo de 6 (seis) horas, como regra geral, deveria ser o mínimo e não o máximo. De outra, uma vez que a excepcionalidade das situações é a sustentação da própria utilização do credenciamento, entendo que todo e qualquer prazo deve ser definido em função dessa excepcionalidade, cuja fixação deve estar sempre justificada no procedimento de contratação do credenciado.24. O último tópico relativo à distribuição dos serviços pelas credenciadas é a “Utilização de Demanda Vinculada”. Considero o critério objetivo e opera como uma espécie de prevenção com possibilidade de maximar qualidade e minimizar custos, pois quem já executa o serviço principal terá maior possibilidade de melhor executar os serviços derivados ou complementares. Preocupa-me o fato de inexistir exatamente essa definição: principal e complementar. De forma mais explícita, as regras deixam a possibilidade de o derivado sem maior que a própria demanda em andamento. Nesse sentido, além da fragilidade demonstrada no item 21 deste Voto, está aberta a porta para criar demandas de forma a beneficiar um credenciado por meio da ampliação de um serviço em execução.25. Deixo de analisar a metodologia de fixação de preços pela EBC, porquanto não tenho elementos para fazê-lo e tratar-se de objeto estranho à presente consulta. Entretanto, da análise das regras apresentadas pela EBC, não verifiquei nenhum dispositivo que impedisse, de maneira segura, que o credenciado passasse a operar como mera “administração contratada”, regime banido pela Lei nº 8.666/1993 e considerado como fonte de peculato pelo Supremo Tribunal Federal por ocasião do julgamento da AP 470. Uma vez que a empresa de publicidade recebia a demanda, a repassava a outras empresas para a efetiva execução dos serviços, recebendo percentuais pela intermediação. Em síntese, não verifico regra alguma de subcontratação a ser imposta aos credenciados pela EBC.26. Dada as características do mercado, onde o trabalho intelectual é uma das tônicas, todas as etapas de execução e o próprio resultado devem ser, de alguma forma, formalizáveis para fins de controle (atas de reuniões de Briefing etc.).27. Tais constatações me fazem votar no sentido de determinar à Segecex que autue e instrua processo para a análise das regras operacionais de credenciamento estabelecidas pela EBC, submetendo-o ao relator no prazo de 60 dias28. Ante o exposto VOTO no sentido de que o Tribunal adote a deliberação que ora submeto ao colegiado.

Sala das Sessões, em 15 de maio de 2013.

AROLDO CEDRAZ16

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Relator

ACÓRDÃO Nº 1150/2013 – TCU – Plenário

1. Processo nº TC 016.304/2012-8.1.1. Apenso: 014.108/2012-72. Grupo II – Classe II – Consulta3. Interessados/Responsáveis: não há.4. Unidade: Secretaria de Comunicação Social – SCS/PR.5. Relator: Ministro Aroldo Cedraz.6. Representante do Ministério Público: não atuou.7. Unidade Técnica: 6ª Secretaria de Controle Externo (Secex/6).8. Advogado constituído nos autos: não há.

9. Acórdão:VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Consulta formulada pela Exmª Srª Ministra

de Estado Chefe da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República.ACORDAM os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em Sessão Plenária,

ante as razões expostas pelo Relator, em:9.1. conhecer da presente consulta para esclarecer a consulente que:9.1.1. é juridicamente viável a utilização pela Empresa Brasil de Comunicação – EBC – da

figura do credenciamento destinado à contratação de pessoas físicas e jurídicas para a prestação de serviços afetos à sua atividade fim, tais como serviços de produção de coberturas e programas jornalísticos, de vídeos institucionais, documentários e os demais narrados na consulta, tendo por fundamento, além dos dispositivos da Constituição Federal detalhados no Voto condutor, os artigos 25 e 27 da Lei nº 11.652/2008, os artigos 25, 26 e 119 da Lei nº 8.666/1993 e o art. 74 do Decreto nº 6.505/2008;

9.1.2. o instituto do credenciamento, para conviver com o disposto no inciso II do art. 37 da Constituição Federal, deverá ser utilizado para projetos específicos ou por prazos limitados segundo requisitos a serem fixados pelo Conselho de Administração da EBC (art. 27 da Lei 11.652/2008), a exemplo da regionalização, dos efeitos da plasticidade do mercado em função da dinamicidade dos fatos e da insuficiência quantitativa e qualitativa (especialização) dos recursos humanos e materiais da EBC para o cumprimento de determinadas tarefas;

9.1.3. as normas operacionais instituídas pela EBC apresentam fragilidades, que colocam em risco os princípios da moralidade e da impessoalidade, conforme descrito nos itens 21 a 25 do Voto condutor deste acórdão;

9.2. determinar à EBC que, no prazo de 30 (trinta) dias, aperfeiçoe as normas procedimentais destinadas à aplicação do instituto do credenciamento, encaminhando os resultados a este Tribunal, sem prejuízo da imediata aplicação do instituto, observadas as cautelas postas no Voto do Relator;9.3. determinar à Segecex que autue e instrua processo específico para a análise das regras operacionais de credenciamento estabelecidas pela EBC em cumprimento ao item 9.2, incluída a metodologia para a fixação dos preços a serem praticados, submetendo-o ao relator.

9.4. encaminhar o presente Acórdão, acompanhado do Relatório e Voto que o fundamentam, para a consulente e para o Ministro de Estado Chefe da Controladoria-Geral da União. 9.5. arquivar os presentes autos.

10. Ata n° 16/2013 – Plenário.11. Data da Sessão: 15/5/2013 – Ordinária.12. Código eletrônico para localização na página do TCU na Internet: AC-1150-16/13-P.

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13. Especificação do quorum: 13.1. Ministros presentes: Augusto Nardes (Presidente), Valmir Campelo, Benjamin Zymler, Aroldo Cedraz (Relator), José Jorge, José Múcio Monteiro e Ana Arraes.13.2. Ministros-Substitutos convocados: Marcos Bemquerer Costa e André Luís de Carvalho.13.3. Ministro-Substituto presente: Weder de Oliveira.

(Assinado Eletronicamente)JOÃO AUGUSTO RIBEIRO NARDES

(Assinado Eletronicamente)AROLDO CEDRAZ

Presidente Relator

Fui presente:

(Assinado Eletronicamente)LUCAS ROCHA FURTADO

Procurador-Geral, em exercício

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